A ignorância é uma benção
Publicado em Andei Pensando... e Cotidiano.
Em um mundo e momento que tanto valoriza a informação e o conhecimento das mais diferentes “coisas”, o que possibilita, a qualquer cronista de plantão, o direito de interpretar atos e sentimentos alheios, quer de pessoas ou instituições, fica uma indagação constante: “o saber propicia ou desequilibra a paz interior?”
Quando a banda britânica Supertramp disse que ”... às vezes, quando o mundo inteiro está dormindo, os questionamentos são profundos demais para um homem tão simples” (música The logical song de 1979), abordava-se o porquê de termos que ser tão precisos, intelectuais, e até mesmo cínicos, para conseguir sobreviver se sobrepondo ao mundo em redor. Tenho assistido, tanto em minha vida pessoal quanto na de tantas outras pessoas que esbarram a todo o momento comigo, uma irritabilidade constante, quase crônica, por termos de conviver com especulações, jogos de interesses, soberba e mentiras dentro dos mais diversificados meios, que vão desde a política a empresas, e até mesmo escolas e igrejas.Chega a parecer que para a maioria das pessoas, tudo pertence ao homem e que somente a ele cabe a prazerosa obrigação de julgar e decidir os desígnios dessa ou daquela instituição ou pessoa. Adora-se o status de “brincar de Deus”, buscando o controle de tudo com as próprias mãos, claro que tendo os próprios interesses como referência.Quanta saudade do tempo em que me dava ao deleite “do saber” como enriquecimento pessoal e, quando necessário, instrumental de ajuda ao outro.
Que saudade do tempo em que “por pouco saber e mais confiar”, dormia mais serenamente.Atualmente tenho exercitado uma atitude que com certeza não condiz com aquilo que esperam de mim. Tenho evitado saber a maioria dos por quês.Não estou fugindo à responsabilidade de opinar no mundo em que vivo; apenas estou procurando filtrar o que posso, ou que não esta em minhas mãos .
Sofrer por causas perdidas ou debater com pessoas que sempre carregam suas verdades bem pré-definidas, nunca se predispondo ao novo, só cansa nossa beleza e fragiliza nossa esperança.Nunca devemos desistir daquilo que consideramos certo, porém faz bem observar que na maioria das vezes não existe um único caminho que obrigatoriamente deva ser seguido, e que novos ares costumam fazer muito bem a toda e qualquer situação.Pena que nossas instituições que tanto pregam a ousadia, o networking e a motivação, sejam tão medíocres em suas atitudes. Sustentam-se no discurso pelo discurso. Palcos de novidades em templos de insegurança.
Conhecimentos existem para ser explorados e vivenciados, mas para isso é indispensável que contemos com pessoas abertas a diálogos e verdades, o que não combina com jogos, quer dessa ou daquela estirpe.Trabalho com pessoas que sofrem.Eu também sofro quando ouço muito e vejo quase nada, que não por acaso é o que mais tenho visto ultimamente.Preciso confessar que ando pecando o pecado da inveja.Como invejo o sono de minhas filhas que ainda, e quem sabe por quanto tempo, vivem mais atreladas às verdades e projetos do que às ganâncias e falta de direção daqueles que insistem em intitularem-se de líderes.Que pena eu ter que acreditar que a ignorância, muitas vezes, é uma benção.
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